Por Ana Paula Tinoco

Vivemos em uma sociedade em que estereótipos são passados de pais/ mães para filhos e filhas e com a evolução de grande parte da sociedade eles vêm cada vez mais caindo por terra e se tornando ultrapassados.

Nas últimas décadas, a sociedade como um todo vem passando por mudanças, mudanças essas que se dão pelo fato de que a cada dia as mulheres vem conquistando seus espaços e provando que estereótipos podem ser vencidos e paradigmas podem ser quebrados. E com esses avanços as barreiras criadas em volta do sexo feminino e sua capacidade vem sendo derrubadas uma a uma, dia após dia e essa reviravolta salienta que partir da premissa de que o gênero mede capacidades ou influencia decisões é voltar no tempo em que nascíamos exclusivamente para servir.

Com a conquista da liberdade é preciso estarmos atentas e atentos a velhos hábitos que de tão enraizados em nossa construção social os reproduzimos muitas vezes sem perceber, sem atentar para o fato de que, geralmente, quando repetimos um comentário estereotipado é porque aquilo foi embutido em nosso subconsciente enquanto ainda éramos jovens. E não é muito raro, escutar alguém dizer que fulana está pronta para casar ao preparar uma bela refeição digna de uma Chef de cozinha renomada ou questionar uma mulher na casa dos 30 anos se ela não terá filhos.

E é por isso que a discussão à cerca da identidade de gênero é importante. É preciso condicionar nossa mente a entender que indiferente de ser menino ou menina, a criança é capaz de ser e se tornar o que ela quiser. E limitar o desejo dela por determinadas áreas de conhecimento como a ciência com argumentos pouco embasados e rasos em que a única justificativa é a de que isso ou aquilo não é “coisa de menina ou é coisa de menino” pode sim acarretar frustrações na vida adulta dessa garota.

A pesquisa realizada pela The Female Quotient (TQF) em parceria com a Unilever, “The Unstereotyped Mindset” (Pensamento Livre de Estereótipos), 9 mil pessoas, distribuídas em oito países, revelaram que estes fatos conservadores ainda as impede de evoluir. E procurando entender a profundidade destes e outros desafios travados por mulheres um relatório que trata da Desigualdade de Gênero liberado pelo Fórum Econômico Mundial, em 2016, estipulou que o alcance por uma equidade pode levar até 170 anos para ser alcançada.

E para desconstruímos esses pré-conceitos é preciso voltar algumas casas e analisar a realidade na qual estamos inseridos. Muitos de nós cresceu ouvindo que futebol é coisa de menino e brincar de casinha é coisa de menina e é sobre isso que a antropóloga Juliana Gonzaga Jayme fala quando diz que fazemos parte de uma sociedade pré-concebida em cima de estereótipos de gênero, “infelizmente nós pensamos ainda de maneira estereotipada. Se você for a uma loja hoje e pedir uma roupa para uma criança recém-nascida vão perguntar se é menina ou menino. Caso você não saiba, o/vendedor/a vai dizer que não há roupa neutra.”.

E ainda segundo Jayme, o porquê da necessidade e importância de se falar sobre gênero está totalmente visível para ultrapassarmos esse discurso arcaico que gira em torno do sexo, “É discutindo gênero que se percebe que as pessoas são diferentes, mas que diferença não pode ser pensada como desigualdade. É estudando gênero que se pode desessencializar a ideia de gênero, problematizar a ideia de que mulheres são frágeis ou que nasceram para determinado tipo de profissão, como aquelas relacionadas ao cuidado.”.

Assim como é preciso ressaltar que os alicerces da nossa sociedade não afetam de forma negativa apenas meninas, meninos também estão condicionados a sofrer com as imposições feitas pelo meio no qual eles estão inseridos. Basta analisar o número de casos violentos em que a criança foi morta por se portar de “forma feminina”, como aconteceu no Estado do Rio de Janeiro em 2014, em que o pai do garoto, Alexandre Soeiro, o agrediu por achar o filho de oito anos “afeminado” por ele gostar de ajudar em casa lavando a louça.

Fato para o qual Jayme chama atenção e pontua é que a criação das crianças deve ser tomada de cuidado e revela que apesar de vários estudos voltados para a discussão de gênero, não é possível ser passivo de consensualidade em tudo. E conclui dizendo que é preciso termos cuidados com certas ideias criadas com base em uma vivência e passar a olhar o grupo como um todo e cita a filósofa Judith Butler, “Desde a gravidez, quando descobrimos o sexo de um bebê, já rotulamos como ele/ela deverão se portar, andar, chorar, do que vão gostar de brincar, que cor vão usar, qual profissão deverão seguir etc.”.

Exemplos de que as crianças estão cada vez mais cientes de que não existe essa relação de brinquedos para meninas e para meninos podem ser vistos em memes que circulam pelas redes sociais. A menina vestida de Batman em meio as amiguinhas de princesas da Disney, meninas com fantasias rosa do Darth Vader (personagem icônico da saga Star Wars), ou como em um caso mais recente que fez as pessoas vibrarem e ganhou grande repercussão, Alice.

Alice é uma garotinha que para sua festa de três anos escolheu ninguém mais ninguém menos que o personagem Hulk dos quadrinhos da Marvel. Questionada do porquê de gostar do “monstrão”, ela diz que gosta dele porque ele é forte. E não se intimidou diante das críticas de que aquilo não era coisa de menina, pelo contrário, apesar da pouca idade, a menina foi categórica ao defender sua paixão com uma frase firme e curta: “Problema meu! ”.

Para mãe de Alice, Jhuli Barros (21), é importante criar a filha com liberdade de escolha sendo bem categórica ao explicar o porquê, “Eu acho muito importante que ela faça as escolhas para não crescer aceitando tudo que as pessoas impõem.”.

Divididas por uma linha estadual, em Minas Gerais temos uma, também, Alice. Alice Valadares que é dona de si e cheias de certezas na ainda breve vida. A Mineira que tem 15 anos fala com convicção sobre o que quer ser quando crescer e o porquê, “Quero ser oncologista”, questionada ela justifica dizendo que é uma área muita escassa nos dias de hoje. E ao perguntar o que ela pensa sobre ser mulher, ela mostra muito mais certeza ao afirmar que sim, a mulher pode ser o que ela quiser.

E é isso que percebemos ao longo dos tempos, as mulheres têm ficado cada vez mais fortes e certas do papel que elas possuem na construção de si mesmas de outras muitas meninas por aí. É importante ressaltar, caso não tenha ficado claro nas linhas anteriores, que quem escolhe o caminho a seguir é a pessoa independente de seu gênero e a cabe a todos apenas respeitar aquilo que o ser humano decide por ser.